Desculpem o trocadilho infame, mas a vida é feita de altos e baixos. Altos, fortes, morenos, sensuais, possíveis...

segunda-feira

Primeiras-primeiras coisas:

Lembro das primeiras-primeiras coisas que eu ganhei… O primeiro boneco articulado, o primeiro carrinho de coleção, o primeiro tênis de marca, aquelas primeiras-primeiras coisas que a gente sempre carrega na cabeça desde de pequeno, sabe?
Quebrei alguns dos presentes desde então. Não de propósito, mas de brincar mesmo. Ficar triste a gente fica por vários motivos enquanto passa o dia, como também sorri. Dá pra ficar ainda mais triste quando se magoa alguém sem querer. Não de propósito, mas de brincar mesmo. E pior ainda quando se quebra algo que lhe foi dado por quem teve o suor e a decisão de te dar aquilo que você se descuidou um segundo, mesmo que seja por brincar mesmo.
Nunca tive um óculos que eu gostasse de usar. É o meu primeiro, e agora tá ali, arranhado. Mas é o primeiro, se existe algo de bom e inesquecível pra gente são as primeiras-primeiras coisas. As primeiras-primeiras tem um gostinho de insubstituíveis.
Claro que vieram mais bonecos e mais carrinhos e mais tênis, vários outros, mas sempre que se olha pro começo das coisas e se lembra deles, é o gostinho de insubstituíveis que fala mais alto.
Fique triste, chateado, aborrecido, arranhou sim, quebrou, não tem concerto. Acontece, mas experiências vividas valem mais, formam o caráter e a vontade de não deixar ir a lembrança das primeiras-primeiras coisas irem embora.
Se for pra culpar alguém, culpe a gravidade, que nunca foi amiga de ninguém, não vá se culpar por viver e acidentalmente viver um pouquinho torto numa hora ou outra. Agradeça que você teve, fez parte de você e culpe a gravidade. Mas permita-se ficar triste, sim, porque isso também é viver. Já disse pra culpar a gravidade?

terça-feira

1 ano depois...

A gente quase completou um ano de namoro, quase.
Faltou um mês ou um pouquinho mais, não lembro.
Mas hoje, sem mais nem menos, completamos um ano de separação.
Ano passado essa hora, exatamente a essa hora, eu lembro bem.
Eu estava num show do que você não quis ir comigo e me ocupava em perguntar, de dez em dez segundos, e de dez em dez pessoas, quando é que você iria me ligar e dizer que tinha pensado melhor.
Quando? Você nunca ligou, nunquinha.
E eu esperei, esperei, esperei tanto tempo, nossa, como eu esperei.
Acho que eu nunca esperei tanto nada em toda a minha vida.
Outro dia me perguntaram o que você tinha me ensinado.
A gente estava conversando sobre os legados que as pessoas deixam em nossas vidas e quiseram saber qual tinha sido o seu.
O coiso me ensinou a gostar de MPB e cinema europeu, o outro coiso me ensinou a gostar de sexo e restaurante caro.
Teve o coisinho que me ensinou a ser engraçado e jogar frescobol. E você?
Que raios me ensinou?
Fiquei sem saber na hora, fiquei sem saber o que responder.
Mas hoje, no nosso aniversário de um ano separados, posso dizer que foi você quem me ensinou a lição mais importante da minha vida: você me ensinou a sofrer.
Eu nunca, nunca, em vinte e seis anos de vida, tinha sofrido.
Nunca. Claro, eu odiava ver meus pais quebrando o pau quando era criança, mas eu lembro que eu, pequenininha, pensava: um dia um príncipe vai me levar para longe dessa casa com gente louca que fuma demais, berra demais, desmaia e chuta vasos. Eu sofri também na escola, quando para alguém me enxergar eu tinha de promover bizarrices. Mas eu era muito novo para me separar das bizarrices e acabava também chamando a minha atenção: será que eu sou bizarro?Depois, em casa, quando eu dobrava direitinho o uniforme para o dia seguinte e me sentia um papel de parede bege que ninguém entende pra que serve, eu pensava: um dia um príncipe vai me levar pra longe dessa falta de vida, dessa falta de beleza, dessa falta de compreensão, dessa falta de cor, dessa falta de sei lá o que porque eu era novinho demais pra saber o que faltava.
Esperar o raio do príncipe sempre disfarçou minha dor, sempre me refugiou dela. Mas quando você, no dia 23 de outubro de 2011, me mandou seguir meu caminho sozinho, fiquei sem saber como fugir da dor.

Você era meu príncipe.
Depois de tantos amores estranhos, pequenos, errados e tortos, finalmente eu tinha reconhecido no seu olhar centralizado e no seu sorriso espalhado, o meu príncipe. E o meu príncipe estava me dando o fora. Que porra eu ia esperar da vida agora? Quem iria me levar para longe se você não me queria mais por perto? Não teve como. Foi a primeira vez na vida que não consegui me enrolar e acabei deixando a dor vencer. Pela primeira vez a realidade falou mais alto que a fantasia. Pela primeira vez a realidade da sua ausência falou mais alto que a fantasia de anos a sua espera. Sofri pra caralho, como diz por aí quem sofre pra caralho.
Mais do que livros cabeças, músicas bacanas, frases inteligentes, lugares descolados ou posições sexuais, você me ensinou o que realmente importa aprender nessa vida: que a vida pode ser uma grande, imensa e gigantesca merda.
É, ela pode ser. E que não existe porra de príncipe porra nenhuma. Que nem ninguém e nem nada pode te levar para longe de nada. É isso e pronto. E é assim pra todo mundo. E pronto. Qual o drama? A dor infinita dos dias infinitos que vieram depois do dia em que você se foi pra sempre veio misturada com toda a dor que eu não senti em todos esses anos. A dor do seu pé na bunda trouxe vasos jogados, bitucas eternas de cigarros em longas discussões pesadas, tardes perdidas em odiar o mundo, cabeças viradas, corredores frios, papéis de parede beges e grupinhos festivos e fechados. A nossa dor acabou sendo toda a dor que fazia fila em mim para ser sentido. E já que a porta pra realidade estava aberta, por que não sofrer também pelas criancinhas carentes, os países em guerra, a estupidez humana e a dor das juntas da minha mãe? Por que não sofrer pela condição das favelas, das prisões e da Terra? Por que não temer o aquecimento global, o ácido dos limpadores de vidro e as frases do Clodovil? A dor da sua partida trouxe toda a dor do mundo. De uma só vez. Mas agora já passa da meia noite. Não é mais nosso aniversário de fim e, pra te falar a verdade, eu já não sofro mais o nosso fim faz tempo. E pra te falar ainda mais a verdade, eu acho mesmo que você foi o príncipe que eu esperei a vida inteira. Você chegou e me levou embora. Levou embora a menino que tinha medo de sentir a vida e esperava uma salvação para tudo. Quem sobrou é esse desconhecido que se conhece muito bem em suas bizarrices, lê jornais todos os dias, substituiu o bege pela cor do verão, tem uns pais gente boa ainda que malucos, adora os poucos e estranhos amigos, não espera mais pelo cavalo branco mas fica ansioso pelo início da novela e talvez esteja pronto para amar de verdade. Amar um homem e não um príncipe.

domingo

O teatro do moço banal



Olho da minha casa e vejo você chegando. Corro para o enorme espelho do meu quarto e repito em mantra: eu não gosto dele, eu não gosto dele, eu não gosto dele.




Tenho quase 30 anos e consegui estragar todos os meus relacionamentos simplesmente porque gostei demais das pessoas. Dessa vez quero acertar, por isso combinei comigo que, apesar de estar morrendo por você, não gosto de você. Espero você tocar a campainha olhando o escuro pelo olho mágico. Meu coração dispara, mas eu mando ele parar. Estraguei todos os meus relacionamentos de tanto que meu coração dispara. Dessa vez quero acertar, dessa vez quero que alguém fique comigo ao menos um mês sem me achar louco. Cansei de sempre ser o garoto louco que espanta todo mundo.

Você tem cheiro de roupa limpinha com mente suja e eu quero te rasgar inteiro. Mas apenas te dou um beijinho no rosto. Preciso me comportar. Ser como as minhas amigas que se dão bem e arrumam namorados apaixonados. Há anos que eu rasgo os rapazes, enlouqueço, me apaixono, devoro. E termino sozinho, querendo morrer enquanto olho sem fome para o pacotinho com dez minipães de queijo.

Chega. Dessa vez vou acertar. Não vou chorar na sua frente porque acho um absurdo estar vivo, não vou pirar porque deu quatro da manhã e eu tenho a impressão de que a noite é uma coisa de pirar a cabeça. Não vou beijar sua nuca no meio da noite e gostar de você como naquela canção do Legião, que diz que é como se não houvesse amanhã. Eu gosto das pessoas pelo prazer de gostar e não porque deu tempo de gostar delas. E ninguém entende nada. E todo mundo se assusta. Mas prometo ser um homem normal dessa vez.

Você não sabe porque eu não te atendi o dia todo. Eu te conto que é porque estava muito ocupado. Minhas amigas sempre usam essa desculpa e sempre namoram. Eu era o louco que nem esperava os caras ligarem e já ligava pra eles.

Mas dessa vez tô ignorando o telefone. Mesmo que ele fique no meio das minhas pernas o dia todo esperando um telefonema seu. Mas você jamais vai sabe disso.

E jamais vai saber mesmo, sabe por quê? Porque você é o primeiro homem do mundo que não sabe que eu escrevo sobre a minha vida. Chega. Todos os homens morrem de medo disso e eu não aguento mais essa porra dessa solidão que me dá toda vez que procuro um pouco de amor nos beijos e abraços curtos que alguém me dá só pra poder transar depois. Chega.




Aí você fala que vai cortar o cabelo e eu quero implorar pra você não cortar. Porque esses seus cachos acabam comigo. O cheiro do seu cabelo. A maneira descabelada que você usa pra parecer arrumado. E eu amo a sua cara de argentino e que você odeia os argentinos. E eu amo como a sua calça nova cai bem em você e como você fica elegante de chinelo. E eu quero te pedir pra deixar tudo como está e não cortar meus cachos prediletos de todos os cachos. Você me salvou. Eu não aguentava mais pensar nos mesmos caras que eram sempre os mesmos caras.Você é novinho em folha e eu sou louco por você. Mas tudo isso eu não te conto pra você não achar que eu sou louco. Chega. Dessa vez vou fazer tudo certo.

Já é a sexta vez que você vem à minha casa e até agora nada. Não transei com você. Apesar de pirar na sua barriga e na sua nuca. E de querer eternizar o seu cabelo e o seu nariz feio. E de achar que o seu cheiro é o cheiro de uma nova vida que eu estava precisando tanto. E de eu te adorar principalmente porque eu já nem sabia mais como era adorar alguém novinho em folha. Não, não transei com você. Chega de transar sonhando em andar de mãos dadas. Agora vou andar de mãos dadas pra ver se vale a pena transar. Porque dessa vez vou fazer tudo direito. Chega.

E você nem sonha que eu sou meio bipolar. Acredito no amor pra sempre. Acredito em alma gêmea. Você nem sonha com essas coisas porque só conversamos coisas leves e engraçadas.

Chega de ser o louquinho intenso. Maior legal transar e se divertir com o louquinho intenso, mas quem aguenta o tranco de me assumir, de me amar?

Ninguém. Chega.

E eu corro no espelho de novo e repito cem vezes que não gosto de você. Não gosto de você. Não gosto de você. Porque se eu gostar de você, eu sei que você vai embora. E eu simplesmente não aguento mais ninguém indo embora. Porque nessa vida maluca só se dá bem quem ignora completamente a brevidade da vida e brinca de não estar nem aí para o amor. E eu preciso me dar bem e por isso ignoro minha urgência pelo amor. Porque, se você sentir urgência em mim, vai é correr urgente daqui. Chega.

E você implora pra gente finalmente transar. Já é a sexta vez que você vem aqui. E eu quero muito. Muito. Porque você tem a voz mansinha e só fala coisa inteligente. E você é cínico sem ser maldoso. Mas não, não. Estou morrendo de vontade de ser eu, mas ser eu só tem me feito perder e perder. E eu quero ganhar. Só dessa vez. Chega.

E eu quero me dar de bandeja pra você. E dentro de mim uma voz diz: pira, enlouquece. Vive um dia e já está bom. Depois eu demoro semanas pra me levantar, mas pelo menos fui intenso e vivi um dia. Mas não aguento mais nada disso. Quero viver uma história. Por isso dessa vez não vou transar e nem gostar de você. Tchau. Peço pra você ir embora. E você jura que eu não estou nem aí pra você. Melhor assim. Dessa vez quero fazer tudo certo. Chega de fazer tudo errado. E eu te espio da janela, indo embora. E quero berrar o quanto gosto de você.

E te pedir em namoro. E rasgar sua roupa. E te comer. E dormir enroscado no seu cabelo. E te mandar flores amanhã. E mais uma vez agir como um homem. Mas eu cansei de ser homem. Chega de usar o homem que eu sou pra ferrar comigo. Eu sou menino. E meninos só transam depois do sexto encontro. Ou depois que o cara fala que gosta deles. Dessa vez vai ser assim. Chega.

E se você não se apaixonar por mim mesmo com todo esse teatro de moço banal que eu estou fazendo, vai ser a prova de que eu precisava pra saber que você realmente vale a pena.

Eu...

Por muito tempo eu fiz o que eu quis. E fazer o que se quer é um privilégio. Você tem que ir contra muitas opiniões, mas afinal, é o que você quer. Por muito tempo eu fiz o que eu quis e não o que precisava fazer. E desta vez, mesmo doendo e me machucando, mesmo tendo que voltar um passo atrás, eu vou fazer o que preciso, pensar um pouco mais em mim. E infelizmente, menos em nós dois.

Viva...


A morte afeta, não importa se ela vem logo ou pondera a vir. Quando ela chega, afeta. Que seja qualquer ser vivo…

Lembro de uma vez que eu fiquei no quintal da minha casa brincando com formigas e aqueles bichinhos tatu bola, que se encolhem e viram bolinha, sabe? Fiquei toda uma tarde e me diverti demais, fui dormir pensando nos dois, iguaizinhos àqueles do filme Vida de Inseto. Quando acordei, fui pra aula e voltei no muro onde os tinha deixado, provavelmente eu não ia achá-los e aquele seria um dia que passou e deixou lembranças, mas eles estavam lá, do mesmo modo. Só que imóveis. Eu não lembro que idade eu tinha, mas lembro que foi a primeira experiência com a morte afetando algo que havia me deixado feliz. E foi rápido, um dia eles estavam lá, outro dia não. Não sei ao certo o que aconteceu, talvez foi eu mesmo brincando e cansando eles, mas sei lá, a morte afeta e ela sempre vem. Isso foi me passado pela primeira vez. Dá para se criar as melhores lembranças antes que ela chegue ou ter medo da sua presença, mas para que a segunda opção? Imagine quantos sorrisos se pode arrancar de uma única lembrança de algo vivo, algo que tem seu destino e suas necessidades igual a nós. Imagine quanto se pode aproveitar sem ter medo? Quanto se pode aprender, criar, experimentar e principalmente… Viver. Aproveite, viva. Aproveite vivendo.

quarta-feira

Sempre

Sempre. Certas coisas sempre serão para sempre. Sempre terão a vivência ocorrida que as tornou indestrutíveis no tempo e as fizeram eternas. E aquele sempre será o morrinho ao lado do barzinho de bebidas onde te vi pela primeira vez. E aquela sempre será a rodoviária onde você foi me buscar sem sinal de celular pra saber se eu realmente estava chegando. Aqueles sempre serão os ingredientes da nossa primeira janta. Os quadros sempre vingarão minha estante. A chuva sempre fará parte da nossa história de sacrifícios. O azul sempre será a cor do nosso dia de namoro. Aquela sempre será a melhor e mais cara sobremesa de nossas vidas. Aquele sempre será o tempero secreto do molho. Você sempre me ganhará naquele jogo de luta, não importa o quanto eu treine. Aquela sempre será a pipoca que deve ser comprada. Aquele sempre será o lugar onde te disse tchau e você foi pra mais perto do céu e longe de mim. Aquele sempre será o desenho favorito com um valor especial por ter trazido tantas risadas e piadas. Aqueles sempre serão os nomes dos nossos filhos. Aquelas duas palavras sempre nos trarão força e te farão lembrar de mim. Aquele sempre será o lugar onde gostaria de te pedir em casamento. Suas mãos sempre serão minha parte favorita do seu corpo. Você sempre será meu primeiro e verdadeiro amor, o mais sincero. Este sempre será o sentimento que sinto por você e estará dentro de mim: Amor. Meus olhos sempre estarão em chamas.

domingo

Cansei...



Cansei das promessas de compra e das devoluções gastas do meu corpo. Cansei de expor minha alma se no fim tudo acaba mesmo. Então tá aqui ó: peitinhos, coxas, barriga e o buraco que você tanto quer. Leve de uma vez e me engane por alguns dias. Você é igual a todos os outros e todos os outros são: lixo. O amor não existe, e, se existe, não dura pra sempre. E, se não dura pra sempre, não é amor. E nada dura pra sempre. E então o amor não existe. (...) A verdade é que mais cedo ou mais tarde você será traído, porque todo mundo tem medo de viver a entrega. A verdade é que ninguém se entrega porque ninguém se tem. A verdade é que não estamos aqui, estamos em algum lugar seguro vivendo nossas vidas medíocres. A verdade é que todo esse perfume é vergonha de nossa essência, todas essas marcas são vergonha do nosso corpo, todo esse charme despretensioso é vergonha de nossas fraquezas. A verdade é que nada é inteiro porque até o inteiro para ser todo precisa ter seu lado vazio. A verdade é que não dá para fugir da dor, e eu continuo correndo, correndo, correndo e não saindo do mesmo lugar.

terça-feira

Foda-se esse amor. E foda-se você.

Sempre achei que esse amor era coisa de quem não tinha nada melhor para fazer. Eu só o sentia porque estava infeliz naquela vida pacata. Só por isso. Resolvi então agitar a vida pacata. E comecei a sair mais de casa, enxergar as pessoas ao meu redor, mais viagens, mais baladas. Amor é coisa de gente pacata e agora que eu tinha uma vida agitada, poderia, finalmente, mandar esse amor embora. Tchau, coisinha besta.
Nada feito. Só piorou. Acordava e ia dormir com ele engasgado aqui. Ficava inconformado. Mas aí concluí: amor é coisa de quem tem tempo pra pensar nele. Claro, mesmo com a semana agitada entre faculdade e trabalho, eu fico em casa o fim de semana todo, alegando cansaço, no silêncio das minhas coisas, claro que acabo pensando besteira. Aquele papo de mente desocupada casa do diabo, sabe? Amor do diabo. Fui procurar Jesus.
Depois de dez passes e de ler todo o Evangelho Espírita, achei que ficaria tudo bem. Ficou nada. Eu só parei de sonhar que botava fogo no apartamento do ser amado ou que arrancava os olhos de todos do mundo. Parei, talvez, de odiar o amor. Mas o amor, na verdade, ficou lá. Duro que nem pedra. Daqueles que não vão embora nem com reza brava.
Amor adolescente, pensei. Com certeza, se eu virar homem, esse amor bobinho passa. Amor de menino bobo. Tratei, então, de virar homem. Quem sabe mudando o visual, esse amor não se mudava de mim? Nada feito. Cabelo novo, roupas novas, sapatos novos, novas contas pra pagar. E o mesmo coração idiota. O mesmo amor de sempre. Coisa chata, não?
Ah, que que é isso! Amor deve passar com um novo amor, não? Olha lá aquele menino bonito te olhando, o outro que escreve bonito, o outro que te faz rir um monte, tem também aquele ali, com mão firme. Nada. Nenhum deles foi capaz de me salvar, de substituir minhas células cansadas em sentir sempre a mesma coisa. Nenhum foi capaz, nem por um segundo, de me levar para passear em outros tormentos. Ou outras alegrias. Qualquer outra coisa que seja.
Aí veio a idéia brilhante. Será que se eu mergulhasse de cabeça na estupidez desse amor, não me curava? Será que se eu, por um minuto apenas, parasse de sentir tudo isso de dentro da grandiosidade que eu inventei para tudo isso e enxergasse de perto como tudo é tosco e pequeno, eu não me curava? Só piorou. De frente para ele e suas constatações tão absurdas a respeito de tudo, só consigo sentir ainda mais amor. E quanto mais e maiores motivos para não sentir, ele e a vida me dão... Adivinhem? Sim, o amor cresce. Irresponsável, sem alimento, sem esperança e de uma burrice enorme. Ainda assim, forte e em crescimento.
Mas esse amor, ah, esse amor é coisa de quem não ama a própria vida. Se um dia, um dia eu pudesse realmente ser um Administrador. Ou até, nossa, se eu pudesse trabalhar numa grande corporação sabe? Esse amor iria embora, claro. Nada feito. Estou aqui graças a minha maior qualidade: a fé. Sim, isso só não funciona pro amor, mas pra todo resto na minha vida acreditar sempre funcionou. Tudo certo com a minha vida. Ou quase tudo certo. Ainda sinto esse amor ridículo. Essa coisa infernal que me vence todos os dias, todos os minutos. Quantos bons contatos me admiram e me elogiam. Ainda bem que alguém além de mim acredita em mim. É tanta coisa boa acontecendo, tanta gente boa se aproximando que tá na hora de acordar. Enxergar. Receber.

Taí. Tá bom. O amor venceu. Você venceu. Venceu. Venceu. Venceu. E eu acabo de descobrir, simples assim, a única maneira de me livrar desse sentimento: aceitando ele, parando de querer ganhar dele. Te amo mesmo, talvez pra sempre. Mas nem por isso eu deixo de ser feliz ou viver minha vida. Foda-se esse amor. E foda-se você.

domingo

Ódio...



 Odeio sentir pena do que já não me faz bem. Odeio sentir dó do que eu amo. Odeio odiar… ‘Onde existe ódio existe amor’ me disse certa vez uma caixa de supermercado numa conversa rápida que tivemos quando eu estava bêbado e resolvi desabafar. Ela tinha razão, e tem até hoje. Sabe, as pessoas que mais nos marcam e dão conselhos que mudam as nossas vidas são aquelas de que menos nos lembramos. Talvez por caus da bebida que eu não lembre muito bem, mas é detalhe… Eu sei que esse meu ódio cresce e desaparece, volta com mais força e some de novo. Só sei que existe ódio, e se ódio é amor, eu odeio amar você.

Hoje...


Hoje eu acordei. E hoje tudo me irrita. Tudo parece errado, torto, diferente de como eu deixei antes de ir dormir. E era pra continuar igual quando acordasse…

Mas não. Hoje todo mundo resolveu discordar de mim, hoje todo mundo resolveu fazer algo pra me irritar, hoje todo mundo resolveu batucar na mesa, arrastar a cadeira, sujar a louça sem lavar, ficar no computador sem me deixar usar, ouvir músicas que eu odeio, rir alto sem me contar o motivo pra rir junto, se bem que eu duvido que iria rir, porque hoje todo mundo resolveu fazer piadas sem graça. Hoje todo mundo resolveu perguntar: O que você tem? Hoje todo mundo podia sumir até meu dia passar e eu ir dormir de novo. Mas… eu gosto de dias assim, porque são neles que eu paro e penso nas coisas sem perguntar a opinião de ninguém e tomo decisões próprias, faço planos, imagino momentos, organizo vontades, arrumo sonhos por ordem de urgência e necessidade pra vida ficar mais interessante. Dias como hoje são feitos pra olhar mais pra si e menos pros outros, mesmo que você note o que todo mundo está fazendo só pra poder reclamar. Dias como hoje são mais íntimos que nossos próprios aniversários.

sábado

Fatos... e acontecimentos...


A gente pode dizer que está bem, dar um sorriso querendo um em troca, mas não por condição, mas pelo sorriso do outro ser tudo que você queria ver e achar que o seu bastasse pra isso, podemos não chorar, aguentar, podemos respirar mesmo quando dói até mesmo pra isso. Podemos ser entendedores de nós mesmos, podemos querer o bem do outro acima do nosso.

Mas chega uma hora que não há como esconder que estamos mal, o seu sorriso não veio e o meu não sai mais, e a gente desaba e então começamos soluçar porque o ar ruim preso precisa sair e sai descontrolado. A gente já não se entende e nos julgamos mal a nós mesmos. Mas querer, progredir para o bem do outro… Sempre, isso sempre, isso nunca acaba.

Frio... Está frio...


Tá frio.

Falta o pezinho esfregando no outro e a gente bem de pertinho com nariz colado rindo por nada, só por estarmos felizes.
Falta eu e você debaixo das cobertas, tomando um chá ou chocolate quente, vendo um filme qualquer, porque nem vamos acabar de assistir.
Acordaremos com o menu tocando a mesma musiquinha pela centésima vez e percebendo que dormimos na metade, abraçados e felizes.
Falta nos enchermos de cachecol, lã, gorro e sairmos na rua pra só depois perceber que não temos luvas e as mãos estão congelando.
É então que a gente anda coordenando o passo pra poder ficar se esquentando de mãos dadas e felizes.
Percebeu que todos os momentos são felizes?
Todos os momentos me imaginando com você acabam assim… Felizes.
Tá frio.
Falta você. Tá frio.
Tenho saudade. Tá frio, quero te cuidar dele, e de todos os outros frios que virão.

quarta-feira

Metade...


porque, há muito, eu erro a mão. a dose. esqueço a receita do equilíbrio. o quanto uso das partes que brigam dentro de mim. há muito, eu me confundo. porque metade não tem medo e levanta os braços, na descida da montanha-russa. olhos abertos, enquanto outra acha melhor enfrentar a queda com as mãos na barra. segurando forte. espremendo os dois olhos, fechados, desde o começo do percurso. metade prefere brincar na beira da praia. no raso. enquanto outra não vê problemas em pular dezenas de ondas e nadar onde a pequena bandeira vermelha, agitada pelo vento, avisa sobre o risco. sobre o possível afogamento. porque, há muito, eu erro a receita do equilíbrio. uso a parte que não deveria na hora em que não poderia. me confundo com as metades que brigam dentro de mim. porque parte acelera na estrada, no momento da curva fechada. pé direito até o fim, enquanto outra freia, bruscamente, ao ver a primeira placa. seta torta, avisando sobre o perigo. metade não suporta a burrice, a pequenez, a lerdeza. outra, sempre calada, tolera a banalidade. engole a ignorância. convive com a mediocridade. há muito, eu erro a mão. a dose. me confundo com o que devo usar. porque metade briga. explode. dedo apontado na cara, enquanto outra se recolhe, quieta, debaixo da cama. no quarto fechado. no tudo escuro. metade berra. outra sussurra. tenho uma parte que acredita em finais felizes. em beijo antes dos créditos, enquanto outra acha que só se ama errado. tenho uma metade que mente, trai, engana. outra que só conhece a verdade. uma parte que precisa de calor, carinho, pés com pés. outra que sobrevive sozinha. metade auto-suficiente. mas, há muito, eu erro a mão. a dose. esqueço a receita do equilíbrio. me perco. há dias em que uso a metade que não poderia. dias em que me arrependo de ter usado a que não gostaria. porque elas brigam dentro de mim, as metades. há algumas mais fortes. outras ferozes. há partes quase indomáveis. metades que me fazem sofrer nessa luta diária. Não deixar que uma mate a outra.

quinta-feira

Será?

Existe alguém socorrer o que não tenho?

Existe pedir ajuda pra simplesmente fazer de conta que nada disso acontece? Existe implorar pra parecer que não tô nem aí? Existe emprestar pernas e peitos para correr com as minhas de forma a não dever nada? Existe ir embora da minha própria cama? Existe sair do meu próprio peito? Existe tirar você daqui de dentro, vomitar você, matar você? E tudo isso só porque, vai ver, esse medo todo é justamente que você saia? Que é isso? Como posso precisar tanto no mesmo instante em que não suporto não ser só meu? Um milhão de coisas que cabiam tanto que ele não suportava, mas a sensação de que não se podia nada.

quarta-feira

Querem que tu mude...


Só que aí eu acabei mudando. E foi mudança aos poucos, porque até hoje me dou conta de coisas minhas que já não estão mais lá e, quem roubou, eu jamais vou saber. O sorriso mudou e a vontade de sorrir pra qualquer pessoa também, graças a Deus. Foi por sorrir tanto de graça que eu paguei tão caro por todas as coisas que me aconteceram. Às vezes me pego olhando ao meu redor e vendo tanto menino parecido comigo. Tanto sentimento gritando de bocas caladas e escorrendo de peles secas. Tanta coisa acontece com a gente. Tanta gente passa pela gente, mas tão pouca gente realmente fica. E eu sei que, talvez, eu tivesse que ficar triste. Talvez eu tivesse que continuar secando lágrimas, abraçando o vento e rindo no vácuo, mas o fato é que eu não consigo. Eu não consigo mais ser triste só para mostrar que um dia eu fui - ou achei que tivesse sido - feliz. Aprendi com os meus próprios erros que sofrer não torna mais poético, chorar não deixa mais aliviado e implorar não traz ninguém de volta. Aprendi também que por mais que você queria muito alguém, ninguém vale tanto a pena a ponto de você deixar de se querer. Eu que gritei para tantas pessoas ficarem, hoje só quero mesmo é que elas sumam de uma vez por todas. E em silêncio, que é pra ninguém ter porque se lamentar.

Meu jeito

Pode invadir ou chegar com delicadeza, mas não tão devagar que me faça dormir. Não grite comigo, tenho o péssimo hábito de revidar.

Acordo pela manhã com ótimo humor, mas... Permita que eu escove os dentes primeiro. Toque muito em mim, principalmente nos cabelos e minta sobre minha nocauteante beleza. Tenho vida própria, me faça sentir saudades, conte algumas coisas que me façam rir, mas não conte piadas e nem seja preconceituoso, não perca tempo, cultivando este tipo de herança de seus pais. Viaje antes de me conhecer, sofra antes de mim para reconhecer-me um porto, um albergue da juventude. Eu saio em conta, você não gastará muito comigo. Acredite nas verdades que digo e também nas mentiras, elas serão raras e sempre por uma boa causa. Respeite meu choro, me deixe sozinho, só volte quando eu chamar e, não me obedeça sempre que eu também gosto de ser contrariado. ( Então fique comigo quando eu chorar, combinado?). Seja mais forte que eu e menos altruísta! Não se vista tão bem... Gosto de camisa para fora da calça, gosto de braços, gosto de pernas e muito de pescoço.

Reverenciarei tudo em você que estiver a meu gosto: boca, cabelos, os pelos do peito e um joelho esfolado, você tem que se esfolar as vezes, mesmo na sua idade. Leia, escolha seus próprios livros releia-os. Odeie a vida doméstica e os agitos noturnos. Seja um pouco caseiro e um pouco da vida, não de boate que isto é coisa de gente triste. Não seja escravo da televisão, nem xiita contra. Nem escravo meu, nem filho meu, nem meu pai. Escolha um papel para você que ainda não tenha sido preenchido e o invente muitas vezes.

Me enlouqueça uma vez por mês, mas, me faça um louco bom, um louco que ache graça em tudo que rime com louco: lobo, bobo, rouco, boca... Goste de música e de sexo, goste de um esporte não muito banal. Não invente de me carregar pra a missa, apresentar sua família... Isso a gente vê depois... Se calhar... Deixa eu dirigir o seu carro, que você adora. Quero ver você nervoso, inquieto, olhe para outros, tenha amigos e digam muitas bobagens juntos. Não me conte seus segredos... Me faça massagem nas costas. Não fume, beba, chore, eleja algumas contravenções. Me rapte! Se nada disso funcionar... Experimente me amar!

Falta de...

Lá estou eu em mais uma mesa com risos pela metade. Olho pro lado e sinto uma saudade imensa, doída, desesperançada e até cínica.

Saudade de alguma coisa ou de alguém, não sei. Talvez de mim, de algum amor verdadeiro que durou um segundo... Meus amigos me adoram. Mas será que eles sabem que se eu estou morrendo de rir agora, mas daqui a pouco vou morrer de chorar? E isso 24 horas. E eu, mais uma vez, olho para o lado morrendo de saudade dessa coisa que eu não sei o que é. Dessa coisa que talvez seja amor. Odeio todos os amores baratos, curtos e não amores que eu inventei só para pular uma semana sem dor. A cada semana sem dor que eu pulo, pareço acumular uma vida de dor. Preciso parar, preciso esperar. Mas a solidão dói e eu sigo inventando personagens. Odeio minha fraqueza em me enganar. Eu invento amor, sim e dói admitir isso. Mas é que não aguento mais não dar um rosto para a minha saudade. É tudo pela metade, ao menos a minha fantasia é por inteiro.. enquanto dura. No final bruto, seco e silencioso é sempre isso mesmo, eu aqui meio querendo chorar, meio querendo mentir sobre a vida até acreditar. E aí eu deito e penso em coisas bonitinhas. E quando vou ver, já dormi.

Ação e reação!

Semana passada ouvi de um grande amigo uma grande verdade: “Chega uma hora na vida que você tem que abrir mão do selvagem dentro de você para manter amigos, empregos e constituir família. Ou você pode escolher ser um louco e viver sozinho.”
No meu último emprego, quando pedi demissão, ouvi do meu chefe, também um grande homem em raras ocasiões: “Toda essa sua mania de ser louquinho e falar o que pensa, só vai te garantir um emprego fixo: banda de rock.”

Acho que todos têm razão. E venho tentando, com orações dadas pela minha mãe desesperada com meu jeitinho nada meigo, yoga, terapia, sexo, pilates, mantras e muita conversa com amigos em geral, ser uma pessoa mais equilibrada.
Uma amiga me disse: “Quem briga por tudo e quer medir poder com todo mundo, na verdade está tentando provar que não é um bosta, tá brigando consigo mesmo”.
Pura verdade, quando minha auto-estima está em suas piores fases, é aí que a coisa pega: fico com mania de perseguição, acho que tá todo mundo querendo foder comigo, que existe um complô universal contra a minha frágil pessoa. Meu ataque nada mais é do que a defesa amedrontada de uma menino bobo.
Mas a verdade é que eu odeio o equilíbrio. Porra, se eu tô puto, eu tô puto! Se eu tô com ciúme, não vou sorrir amarelo e mostrar controle porque preciso parecer forte e bem resolvido. Se o filho da puta que senta do meu lado é um filho da puta, eu não vou fazer política da boa vizinhança, eu vou mais é berrar e libertar essa verdade de dentro do meu fígado: você é um grandessíssimo filho de uma puta! Se a vaca da catraca do teatro me tratou mal, eu vou mais é falar mesmo que ela é uma horrorosa que não vê pica há anos!
O sangue ferve aqui dentro, e eu não tô a fim de transformá-lo num falso líquido rosa que um dia vai me dar um câncer. Eu não tô a fim de contar até 100, eu quero espancar a porta do elevador se ele demorar mais dois segundos, quero morder o puto do meu namorado que apenas sorri seguro enquanto eu me desfaço em desesperos porque amar dói pra caralho, quero colocar TODAS as pessoas do meu trabalho que falam “Fala, floRRRR!” ou “Precisamos disso ASAP” numa câmera de gás peristáltico.

Eu sou antipático mesmo, o mundo tá cheio de gente brega e limitada e é um direito meu não querer olhar na cara delas, não tô fazendo mal a ninguém, só tô fazendo bem a mim. Minha terapeuta fala que eu preciso descobrir os outros eus: eu amigo, eu simpático, eu meigo, eu que respira, eu que pensa, eu que não caga em tudo porque deixou eu imbecil de cinco anos tomar as rédeas da situação.
Ela tem razão, mas é tão difícil ver todos vocês acordando de manhã sem nada na alma, é tão difícil ver todos os casais que só sobrevivem na cola, é praticamente impossível aceitar que as contas do final do mês valham a minha bunda sentada mais de 8 horas por dia pensando o quanto eu odeio essa gente que se acha “super” mas não passa de vendedor de sabonete ambulante.
É tão difícil ser mocinho em terno novo e sapato bico fino quando tudo o que eu queria era rasgar todos os enfeites no meio da pista enquanto as tias chifrudas bebem para esquecer as dúvidas ao som de “Love is in the air”.
Parem de sorrir automaticamente para tudo, humanos filhos da puta, admitam que vocês não fazem a menor idéia do que fazem aqui. Admitam a dor de estar feio, e admitam que estar bonito não adianta porra nenhuma.

Eu já me senti um lixo de pijama com remela nos olhos, mas nunca foi um lixo maior do que me senti gastando meu dinheiro numa bosta de salão de beleza enquanto crianças são jogadas em latas de lixo porque a total miséria transforma qualquer filho de Deus em algo abaixo do animal.
Mas eu não faço nada, eu continuo querendo usar uma merda de roupinha da moda numa merda de festinha da moda no meio de um monte de merdas que se parecem comigo. Eu quero feder tanto quanto eles para ser bem aceito porque, quando você faz parte de um grupo, a dor se equilibra porque se nivela.
E eu continua perdido, sozinho, achando tudo falso e banal. Acordando com ressaca de vida medíocre todos os dias da minha vida.
Grande merda de vida, você muda a estação do rádio para não reparar que a menina de dez anos parada ao lado do seu carro, já tem malícia, mas não tem sapatos. Você dá mais um gole no frisante para não reparar que a moça da mesa ao lado gostou do seu namorado, e ele, como qualquer imperfeito ser humano normal, gostou dela ter gostado.
Você disfarça, a vida toda você disfarça. Para não parecer fraco, para não parecer louco, para não aparecer demais e poder ser alvo de crítica, para ter com quem comer pizza no domingo, para ter com quem trepar na sexta à noite, para ter quem te pague a roupa nova e te faça sentir um bosta e para quem te pede socorro, você disfarça cegueira.
Você passa a vida cego para poder viver. Porque enxergar tudo de verdade dói demais e enlouquece, e louco acaba sozinho. Vão querer te encarcerar numa sala escura e vazia, ninguém quer ter um conhecido maluco que lembra você o tempo todo da angústia da verdade e de ter nascido. Você passa a vida cego, mentindo, fingindo, teatralizando o personagem que sempre vence, que sempre controla, que sempre se resguarda e nunca abre a portinha da alma para o mundo. Só que a sua portinha um dia vira pó, e você morre sem nunca ter vivido, e você deixa de existir sem nunca ter sido notado. Você é mais um cara produzido na foto de mais uma festa produzida, é um coadjuvante feliz dessa palhaçada de teatro que é a vida.

Você aceitou tudo, você trocou as incertezas da sua alma pelas incertezas do moço da novela, porque ver os problemas em outros seres irreais é muito mais fácil e leve, além do que, novela dá sono e você não morre de insônia antes de dormir (porque antes de dormir é a hora perfeita para sentir o soco no estômago).
Você aceita a vida, porque é o que a gente acaba fazendo para não se matar ou não matar todos os imbecis que escutam você reclamar horas sem fim das incertezas do mundo e respondem sem maiores profundidades: relaaaaaaaaaaaaaxa!
Eu não vou fumar, eu não vou cheirar, eu não vou beber, eu não vou engolir, eu não vou fugir de querer me encontrar, de saber que merda é essa que me entristece tanto, de achar um sentido para eu não ser parte desse rebanho podre que se auto-protege e não sabe nem ao certo do quê. Eu não vou relaxaaaaaaaaaaaaaaaaaar.
A única verdade que me cala um pouco e, vez ou outra, me transforma em alguém estupidamente normal é que virar um louco selvagem que fala o que pensa, sem amigos e sem namorados, só é legal se você tiver alguém pra contar o quanto você é foda no final do dia.

Nada!

Essa vida viu, Zé. Pode ser boa que é uma coisa. Já chorei muito, já doeu muito esse coração. Mas agora tô, ó, tá vendo? De pedra. Uma tora. Um macho.
Na quarta eu não vi o senhor, mas será que o senhor me viu chegando cedinho, com o dia amanhecendo? Balada, Zé. E da boa. Sabe quem tava lá? Esse mesmo. Ele que veio me trazer, o senhor não viu? Ah, o senhor viu? Que vergonha. Eu tava meio caindo pelas beiradas não era? Era sono. Tá, um pouco disso e um pouco daquilo também, mas basicamente sono. O senhor não viu ele indo embora? Então somos dois. Mas vou confessar pro senhor: adoro quando eles vão embora sem me dar nenhum trabalho.

Se eu cobro? Que é isso, seu Zé! Tá louco? Sou menino de família! Trabalhador, estudante e a espera de um grande amor. Mas to me divertindo, ué. Não é isso que mandam a gente fazer? Quando a gente chora e escreve aquele monte de poesia profunda. Quando a gente se apaixona e tudo mais e enche o saco dos amigos com aquela melação toda. Não fica todo mundo dizendo pra gente parar de tanto drama e se divertir? Poxa, to só obedecendo todo mundo.
Não é isso que todo mundo acha super divertido? Beber e fumar, e beber, e fazer sexo sem amor, e beber e fumar e dançar e chegar tarde e envelhecer e não sentir nada?
Sabe Zé, no começo doeu não sentir nada. Mas eu consegui. Eu não sinto nada. Nada. Uns vem, uns vão. As garrafas tão lá, ao lado do lixo. As cinzas saem dançando por aí. As minhas vão junto. No dia seguinte eu acordo, tomo um banho, passo protetor solar, sento na minha varanda com o meu jornalzinho e ó: nada.

Nadinha. Nem pena do mundo eu consigo mais sentir. Minha pureza era linda, Zé, mas ninguém entendia ela, ninguém acolhia ela. Todo mundo só abusava dela. Agora ninguém mais abusa da minha alma pelo simples fato de que eu não tenho mais alma nenhuma. Já era, Zé. É isso que chamam de ser esperto? Nossa, então eu sou uma ninja. Bate aqui no meu peito, Zé? Sentiu o barulho de granito? Quebrou o braço, Zé? Desculpa.
Mas hoje é quinta, hoje tem visita. Hoje tem risada alta, tem festinha, tem maquiagem e música. O senhor promete que não me julga, Zé? Eu sei que você se atrapalha, liga aqui pra cima e fica até mudo.

São tantos nomes, não é? Mas é só fazer que nem eu: chama todo mundo de “o outro”. Todos são outros. Porque o de verdade, Zé, o de verdade não existe. A gente chora, escreve lá umas poesias profundas, chora, mas um dia a gente acorda e descobre que esse aí não existe não.
Amanhã é sexta, um novo dia. Um novo outro qualquer. Eu queria te dizer que eu sinto muito, Zé.
Mas eu não posso te dizer isso porque a verdade é que eu não sinto mais nada. Nadinha, Zé.

sexta-feira

Espartanos - O livro!

A vida daqueles meninos os condicionaria a se tornarem guerreiros de Esparta: Alceu, Iolau, Heleno e Clício deixam suas posições de crianças para traçarem sua trajetória rumo à glória de servir sua cidade, em seus ínfimos sete anos de idade.

A realidade em que são expostos é agressiva, é intimidadora e implacável. Apenas os fortes sobrevivem para que haja “liberdade para os gregos!” e, cada um, a sua maneira, mostra sua força para driblar os perigos que aparecem – tanto perigos para sua imagem como cidadão de Esparta, quanto perigos que colocam suas próprias vidas em risco.
Ao passar dos anos, e com seus desenvolvimentos pessoais construindo suas posições sociais na realidade em que vivem, os meninos se tornam adolescentes e, após, homens. Novas personagens vão se inserindo na vida dos protagonistas e criam novas estruturas para situação que explode ao redor, a guerra entre Esparta e Atenas.
Escrito com fluidez, o romance é uma verdadeira arca de informações históricas. Arca essa, aberta em cada trejeito de fala das personagens e na facilidade com que o narrador coloca o leitor imerso na realidade que está propondo. A carga informativa da obra não impede que o leitor, já impregnado pela verdade descrita, se emocione e se surpreenda a cada novo fato narrado.
Transitando entre as diferentes visões dos jovens guerreiros, a narrativa problematizará diferentes valores sociais da Antiguidade Clássica com a visão de mundo contemporânea do leitor, debatendo assuntos que vão desde as possíveis políticas que existiam, relações familiares, amor, até as vestimentas, tudo dentro de uma descrição minuciosa e embebedada pelo homoerotismo.
A obra entretém, além de informar, e pode ser usada como ponto de partida para discussões mais amplas que ultrapassam a época em que há o desenrolar da história. É uma trama que avança além do que se propõe, uma resposta artística a História de ontem e hoje.

Gabriel Bruno Martins

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Vale a pena ler...

Não mandei gostar...

Cansei de quem gosta como se gostar fosse mais uma ferramenta de marketing. Gostar aos poucos, gostar analisando, gostar duas vezes por semana, gostar até as duas e dezoito. Cansei de gente que gosta como pensa que é certo gostar. Gostar é essa besta desenfreada mesmo. E não tem pensar. E arrepia o corpo inteiro, mas você não sabe se é defesa para recuar ou atacar. Eu eu gosto de você porque gostar não faz sentido.

Permita-se. Se você acha que no fundo mesmo, apesar de todas essas reuniões e palavras em inglês que só querem dizer que você não sabe o que está falando, o que importa é ter pra quem mostrar que saiu o arco-íris. Permita-se. Porque eu não quero que você tenha essa pressa ao ponto de ajudar com as próprias mãos. Eu quero que você sinta esse prazer que chega aos poucos. E mata tudo que há em volta. E explode os relógios. E chega aos poucos ainda que você ainda não saiba nem quem é pouco e nem quem é lento. Porque você morre. Se você prefere a vida quando se morre um pouco por alguém. permita-se.
Eu não faço a menor idéia de como esperar você me querer. porque se eu esperar, talvez eu não te queira mais.

Eu não queri ir embora e esperar o dia seguinte. porque cansei dessa gente que manda ter mais calma. E me diz que sempre tem outro dia. E me diz que eu não posso esperar nada de ninguém. E me diz que eu preciso de uma camisa de força. Se você puder sofrer comigo a loucura que é estar vivo. se você puder passar a noite em claro comigo de tanta vontade de viver esse dia sem esperar o outro, se você puder esquecer a camisa de força e me enrroscar no seu corpo para que duas forças loucas tragam algum aquilibrio. Se você puder ser alguém de quem se espera algo, afinal, é uma grande mentira viver sozinho, permita-se. Eu só queria alguém pra vencer comigo esses dias terrivelmente chatos.

Faz de Conta

Não respondo teus e-mails, e quando respondo sou ríspido, distante, mantenho-me alheio: FAZ DE CONTA QUE EU TE ODEIO
Te encho de palavras carinhosas, não economizo elogios, me surpreendo de tanto afeto que consigo inventar, sou um ator, sou do ramo: FAZ DE CONTA QUE EU TE AMO.
Estou sempre olhando pro relógio, sempre enaltecendo os planos que eu tinha e que os outros boicotaram, sempre reclamando que os outros fazem tudo errado: FAZ DE CONTA QUE EU DOU CONTA DO RECADO.
Debocho de festas e de roupas glamurosas, não entendo como é que alguém consegue dormir tarde todas as noites, convidados permanentes para baladas na área vip do inferno: FAZ DE CONTA QUE EU NÃO QUERO.
Choro ao assistir o telejornal, lamento a dor dos outros e passo noites em claro tentando entender corrupções, descasos, tudo o que demonstra o quanto foi desperdiçado meu voto: FAZ DE CONTA QUE EU ME IMPORTO.
Digo que perdôo, ofereço cafezinho, lembro dos bons momentos, digo que os ruins ficaram no passado, que já não lembro de nada, pessoas maduras sabem que toda mágoa é peso morto: FAZ DE CONTA QUE EU NÃO SOFRO.
Cito Aristóteles e Platão, aplaudo ferros retorcidos em galerias de arte, leio poesia concreta, compro telas abstratas, fico fascinado com um arranjo techno para uma música clássica e assisto sem legenda o mais recente filme romeno: FAZ DE CONTA QUE EU ENTENDO.

Tenho todos os ingredientes para um sanduíche inesquecível, a porta da geladeira está lotada de imãs de tele-entrega, mantenho um bar razoavelmente abastecido, um pouco de sal e pimenta na despensa e o fogão tem oito anos mas parece zerinho: FAZ DE CONTA QUE EU COZINHO.
Bem-vindo à Disney, o mundo da fantasia, qual é o seu papel? Você pode ser um fantasma que atravessa paredes, ser anão ou ser gigante, um menino prodígio que decorou bem o texto, a criança ingênua que confiou na bruxa, um sex symbol a espera do seu cowboy: FAZ DE CONTA QUE NÃO DÓI.

sábado

Desisto...

Desisti. E isso é a coisa mais triste que tenho a dizer. A coisa mais triste que já me aconteceu. Eu simplesmente desisti. Não brigo mais com a vida, não quero entender nada. (…) Vou nos lugares, vejo a opinião de todo mundo, coisas que acho deprê, outras que quero somar, mas as deixo lá. Deixo tudo lá. Não mexo em nada. Não quero. Odeio as frases em inglês, mas o tempo todo penso “I don’t care”.
Caguei. Foda-se. (…) Me nego a brigar. Pra quê? Passei uma vida sendo o irritadinho, a que queria tudo do seu jeito. Amor só é amor se for assim. Sotaque tem que ser assim. Comer tem que ser assim. Dirigir, trabalhar, dormir, respirar. E eu seguia brigando. Querendo o mundo do meu jeito. Na minha hora. Querendo consertar a fome do mundo e o restaurante brega. Algo entre um santo e um pilantra. Desde que no controle e irritado. Agora, não quero mais nada. De verdade. (…) Não quero arrumar, tentar, me vingar, não quero segunda chance, não quero ganhar, não quero vencer, não quero a última palavra, a explicação, a mudança, a luta, o jeito. (…) Quero ver a vida em volta, sem sentir nada. Quero ter uma emoção paralítica. Só rir de leve e superficialmente. Do que tiver muita graça. E talvez escorrer uma lágrima para o que for insuportável. Mas tudo meio que por osmose. Nada pessoal. Algo tipo fantoche, alguém que enfie a mão por dentro de mim, vez ou outra, e me cause um movimento qualquer. Quero não sentir mais porra nenhuma. Só não sou um suicida em potencial porque ser frio me causa alguma curiosidade.

O mundo me viu descabelar, agora vai me ver dormir e cagar pra ele. Eu quis tanto ser feliz. Tanto. Chegava a ser arrogante. O trator da felicidade. Atropelei o mundo e eu mesmo. Tanta coisa dentro do peito. Tanta vida. Tanta coisa que só afugenta a tudo e a todos. Ninguém dá conta do saco sem fundo de quem devora o mundo e ainda assim não basta. Ninguém dá conta e… quer saber? Nem eu. Chega. Não quero mais ser feliz. Nem triste. Nem nada. Eu quis muito mandar na vida. Agora, nem chego a ser mandado por ela. Eu simplesmente me recuso a repassar a história, seja ela qual for, pela milésima vez. Deixa a vida ser como é. Desde que eu continue dormindo. Ser invisível, meu grande pavor, ganhou finalmente uma grande desimportância. Quase um alivio. I don’t care.

sexta-feira

Eu e o resto do mundo

Eu sentia tudo e com muita particularidade desde que começou a sentir alguma coisa. Tudo começou no dia em que sentiu sua primeira raiva, lembra bem. Eu isso, eu aquilo, eu, eu, eu. Desde pequenininho essa força absurda pronta pra destruir brocas ou a si mesmo.

O resto do mundo fritava menos, enquanto isso. Quem têm irmãos, pensa menos como é um absurdo nascer. O resto do mundo via que do mesmo buraco outros tinham chegado. O resto do mundo seguiu a carreira que todo o resto do mundo segue. O resto do mundo ganhou dinheiro porque o resto do mundo, a sua volta, ganhava. O resto do mundo achava que alguma coisa ia mal, alguma coisa faltava. Mas vai ver que é assim com todo mundo.
Eu sabia que faltava alguma coisa e que essa coisa que faltava, dessa maneira e desse jeito, era algo muito meu. Por isso escolhi fazer uma coisa que mais ninguém no mundo poderia fazer a não ser eu mesmo. Eu tinha tanto o que pensar e sentir, que refutri muitas coisas. Eu podia parecer preconceituoso, mas era apenas ocupado em mim mesmo. O que parecia um erro terrível, mas era só um medo filho da puta do resto do mundo.
O resto do mundo continuava achando que algo faltava e então chamou isso de tristeza. E então, ficou perto de gente triste, pra poder ser triste. Se o resto do mundo fosse eu, ficaria triste e pronto. Mas o resto do mundo precisava de mundo, pra sugar e tal. Ainda que depois, se fechasse em seu mundo pra brincar de eu. Depois achou que lhe faltava morte, e ficou perto da morte. Depois achou que lhe faltavam palavras e assim fez, morou com as palavras por anos. Até que as emprestou e virou um pouco as palavras. O resto do mundo é música, é letra, é história, é tudo. O resto do mundo é gigantesco. Mas tem um medo filho da puta de ser eu.

Eu também adoro brincar de resto do mundo. Saio sempre que posso de casa. Experimento tudo. Tento entrar nas coisas. Tento deixar as coisas um pouco dentro de si. Logo vem o medo de vomitar. De expulsar tudo que não é eu. Eu preciso do resto do mundo perto o tempo todo, para senti-lo. De longe, eu só sinto eu. Eu rio do resto do mundo. Um misto de nervoso, arrogância, ritual de sobrevivência e servidão.
Eu virei eu justamente pra me proteger do resto do mundo. Então, quando escuto que sou amado pelo mundo, duvido, provoco e espanto. O resto do mundo virou resto do mundo justamente porque ser eu enlouquece e é limitado. Então, por mais que eu seja esperto, o resto do mundo só vê um rato de laboratório, preso e correndo em sua esteirinha.
Eu adoraria casar e ter filhos e construir um lar. Mas para isso teria que ser um pouco nós. O que é quase a morte. O resto do mundo pode ser tantas coisas, pode se vestir de tantas coisas, que não é e nem quer coisa de ninguém em específico. E também acabou sozinho.
Eu como pouco e vivo enjoado. O resto do mundo engole o que vê pela frente e vive com dor de estômago. Um é ligado demais por dentro, não quer mais do que é porque o que é já quase o explode. O outro nem lembra o que esse por dentro agüenta, de tanto que carrega tudo pra ser algo. Pode tanto tudo que tudo banaliza.
Eu digo coisas feias que saem sem filtro e de dentro. O resto do mundo diz coisas lindas que já chegaram filtradas, de fora. Os dois sabem do que o outro está falando, mas é que dá uma preguiça desgraçada parar de brincar só porque a bola caiu do outro lado do muro.
Eu e o resto do mundo, somos seres solitários que se atacam. Cada um pra defender o seu ser de tantos mil anos. Um sem saber o que fazer com o amargo que desce da boca pro cu. O outro sem saber o que fazer com o amargo que sobe do cu pra boca. Um com medo do que pode calar tantas certezas conquistadas na ignorância, o outro com medo da voz trêmula que poderia ter a sua inteligência se não estivesse pautada em algo. Eu não sabe o que sente, mas diz mesmo assim. O resto do mundo tem certeza do que sente, mas quando diz, fala pelo resto do mundo. Eu entendo só de mim, o que já é uma humanidade inteira. O resto do mundo entende de todo o resto, o que faz eu parecer uma criança de cinco anos se debatendo pra entender tanta vontade de chorar ou de ser feliz.
Eu e o resto do mundo desistiram de se amar em suas roupas rasgadas pela luta. Mas nus, eu empresto do resto do mundo um silêncio que seu eu jamais lhe daria. Ter o resto do mundo dentro de si é a morte mais feliz. Ainda que doa e ainda que seja morte.

E o resto do mundo pára, quem diria. O mundo pára pra me ver. O mundo pára para ver como me sinto e se explica sem fim. Sem eu, o mundo é um lugar enorme, mas sem vida passeando em suas riquezas. Eu preciso do mundo para ser lido. E o resto do mundo precisa de mim para ser livro.
Depois eu volto a sentir tudo com uma solidão avassaladora. Depois o resto do mundo volta a rodar. A rodar e atropelar me. A rodar e trucidar me. Eu volto a martelar em si. O resto do mundo volta a somar todos os martelos do mundo para se sentir martelado. Cada um na sua despedida egoísta, vingativa e perdoável. Na sua vida a dois que não existe a não ser por essa intersecção, no ponto onde eu me esqueço pra pertencer e o resto do mundo se encontra pra ser alguma coisa.
Não é inveja isso que nutrem um pelo outro. Nem ciúme. Nem ódio. Nem maldade. É absurdo. É só absurdo. Algo tão parecido com amor que confunde a vida.

domingo

MEU REINO POR UMA PESSOA INTERESSANTE

Não sei mais o que fazer das minhas noites durante a semana.
Em relação aos finais de semana já desisti faz tempo: noites povoadas por pessoas com metade da minha idade e do meu bom senso.

Nada contra adolescentes, muitos deles até são mais interessantes e vividos do que eu, mas tô falando dos de "fabricação em série". Tô fora de dançar os hits das rádios e ter meu braço ou cabelo puxado por um garoto que fala tipo assim, gato, iradíssimo, tio.
Tinha me decidido a banir a palavra "balada" da minha vida e só sair de casa para jantar, ir ao cinema ou talvez um ou outro barzinho cult, desses que tem aberto aos montes em bequinhos charmosos.
Mas a verdade é que por mais que eu ame minhas amigos, a boa música e um bom filme, sinto falta de um amor.
Já tentei paquerar em cafés e livrarias, não deu muito certo, as pessoas olham sempre pra mim com aquela cara de "tô no meu mundo, fique no seu".
Tentei aquelas festinhas que amigos fazem e que sempre te animam a pensar  "se são meus amigos, logo devem ter amigos interessantes".  Infelizmente, essas festinhas são cheias de casais e um ou outro esquisito desesperado pra achar alguém só porque os amigos estão todos acompanhados.
Tô fora de gente desesperada, ainda que eu seja quase uma.
Baladas playbas com garotas prontos para um casamento e rapazes que exibem a chave do Audi, tô mais do que fora.
Baladas playbas com garotos praianos hippie-chique que falam com voz entre o fresco e o nasalado (eles misturam o desejo de ser meigos com o desejo de ser manos com o desejo de ser patos) e rapazes garotos-propaganda Adidas com cabelinho playmobil, também tô fora.
MUNDO IDIOTA. O que sobra então? Barzinhos de MPB? Nem pensar.
Até gosto da música, mas rapazes que fogem do trânsito para bares abarrotados, bebem discutindo a melhor bunda da firma e depois choram "tristeza não tem fim, felicidade sim" no ombro do amigo têm grandes chances de ser aquele tipo que se acha superdescolado só porque tirou a gravata e porque fala tudo metade em inglês, ao estilo "quero te levar pra casa, how does it sound?"
Para dançar, os muquifos eletrônicos alternativos são uma maravilha, mas ainda que eu não seja preconceituoso com esse tipo, não estou a fim de beijar bissexuais sebosos, drogados e com brinco pelo corpo todo.

Na praia, quem é interessante além de se isolar acorda cedo,  aí fica aquela sensação (verdadeira) de que só os idiotas vão à praia e às baladinhas praianas.
Orkut, MSN, chats. me pergunto onde foi parar a única coisa que realmente importa e é de verdade nesta vida: a tal da química.
Mas então onde, meu Deus? Onde vou encontrar gente interessante? O tempo está passando, meus ex já estão quase todos casados, minhas amigas já estão quase todas pensando no nome do bebê. E eu?
Até quando vou continuar achando todo mundo idiota demais pra mim e me sentindoo mais idiota de todos? Foi então que eu descobri. Ele está exatamente no mesmo lugar que eu agora, pensando as mesmas coisas, com preguiça de ir nos mesmos lugares furados e ver gente boba, com a mesma dúvida entre arriscar mais uma vez e voltar pra casa vazio ou continuar embaixo do edredom lendo mais algumas páginas do seu mundo perfeito.

A verdade é que as pessoas de verdade estão em casa. Não é triste pensar que quanto mais interessante uma pessoa é, menor a chance de você vê-la andando por aí?

segunda-feira

E então !!


O que me faz tão diferente de você?
Bom acho que nada !  Será ? Você usa salto alto e
 cinta liga  eu também posso usar,cremes tinturas
e esmaltes..porque não ?
Hum já entendi a diferença ... não está na aparência
nem nos meus órgãos genitais e sim
no meu jeito simples de ser, tenho carácter que você
infelizmente não possui,honro com as minhas palavras  já você..!!
Atitude sempre tive! Não sei usar mascaras e nem maquiagens borradas
apenas sou quem eu sou..e acredite ou não tem quem goste..
Não me rotule alias .. já se viu no espelho hoje ?




sábado

CADÊ A TAMPA DA MINHA PANELA, O CHINELO DO MEU PÉ CANSADO, A METADE DA MINHA LARANJA?




E chega! Há anos peço o príncipe e só me mandam o cavalo.
Dizem que materializar os sonhos escrevendo ajuda, então lá vai: quero transar com beijo na boca profundo, olhos nos olhos, eu te amo e muita sacanagem, quero cineminha com encosto de ombro cheiroso, casar de branco, ser carregado no colo, filhos, casinha no campo com cerquinha branca, cachorro e caseiro bacana. Quero ouvir Chet Baker numa noite chuvosa e ter de um lado um livrinho na cabeceira da cama e do outro o homem que amo.

Que a gente brigue de ciúmes, porque ciúmes faz parte da paixão, e que faça as pazes rapidamente, porque paz faz parte do amor. Quero ser lembrado em horários malucos, todos os horários, pra sempre. Quero ser criança, homem, et, megero, maluco e, ainda assim, olhado com total reconhecimento de território. Quero sexo na escada e alguns hematomas e depois descanso numa cama nossa e pura.
E quando eu tiver tudo isso e um menino bobo e invejoso me olhar e pensar que "aquela instituição feliz não passa de uma união solitária de aparências" vou ter pena desse coração solitário que ainda não encontrou o verdadeiro amor.

domingo

Um cigarro por favor...




Você foi covarde. Seu amor é forte, seu corpo é fraco. Você foi covarde como tantas vezes fui por acreditar que a coragem viria depois. A coragem não vem depois. A coragem vem antes ou não vem. Não posso amaldiçoar sua covardia. Sua boca não é rápida como suas pernas para me agarrar. Minhas pernas não são tão rápidas quanto minha boca para lhe impedir. Você foi covarde. Pela gentileza de sempre dizer sim, repetidos sim, quando não estava ouvindo. Já desfrutei de sua covardia, ríspido recusá-la agora porque não me favorece. Porque não fui escolhido. Não aquecerei seu prato para servi-lo. Não o ajudarei no parto. Não partirei. Serei aquele que deveria ter sido, enterrado sem morrer, o que desapareceu permanecendo perto. Sou seu constrangimento mais alegre. Sua ferida, seu feriado. Com o tempo, serei sua vontade de se calar. De se retirar da sala. Não conhecerá meus hábitos de puxar o café antes de ficar pronto. De abrir as venezianas como quem procura reunir os chinelos ao vento. Você foi covarde, ninguém iria compreendê-lo. Hoje todos o compreendem, menos você mesmo. Você não se compreende depois disso. O que é imenso é estreito. O que é infinito fecha. Até o oceano tem becos e ruas sem saída. Até o oceano. Sua esperança não diminui a covardia. Quer um conselho? Finge que a dor que sente é a minha para entreter sua dor. Saudades ficam violentas quando mudamos de endereço. Saudades ficam insuportáveis quando mudamos de sentido.



Você confunde sacrifício com covardia. Compreendo. Eu confundo amor com loucura. Cada um tem seus motivos, sua maneira de se convencer que fez o melhor, fez o que podia. Você me avisou que não tinha escolha. Nunca teria escolha. Você foi educado com a vida, pediu licença, agradeceu os presentes. Confiou que a vida logo o entenderia. E cederia. Engoliu uma palavra para dormir. Não serei vizinho de seu sobrenome. Seus nomes esperam um único nome que ficou para trás. Você não desencarnou, não se encarnou, deixou sua carne parada nas leituras. Morrer é continuar o que não foi vivido. Vai me continuar sem saber. Você foi covarde. Com sua ternura pálida, seu medo de tudo, sua polidez em cumprir as promessas. Você não aprendeu a mentir. Tampouco aprendeu a dizer a verdade. O dia está escuro e não soprarei a luz ao seu lado. O dia está lento e não haverá movimento nas ruas. Você não revidou nenhuma das agressões, não revidará mais essa. Você foi covarde. A mais bela covardia de minha vida. A mais comovida. A mais sincera. A mais dolorida. O que me atormenta é que sou capaz de amar sua covardia. Foi o que restou de você em mim.

quarta-feira

Sentir-se amado!



O cara diz que te ama, então tá. Ele te ama.
Você sabe que é amado porque lhe disseram isso, as três palavrinhas mágicas. Mas saber-se amado é uma coisa, sentir-se amado é outra, uma diferença de milhas, um espaço enorme para a angústia instalar-se.
A demonstração de amor requer mais do que beijos, sexo e verbalização, apesar de não sonharmos com outra coisa: se o cara beija, transa e diz que me ama, tenha a santa paciência, vou querer que ele faça pacto de sangue também?
Pactos. Acho que é isso. Não de sangue nem de nada que se possa ver e tocar. É um pacto silencioso que tem a força de manter as coisas enraizadas, um pacto de eternidade, mesmo que o destino um dia venha a dividir o caminho dos dois.
Sentir-se amado é sentir que a pessoa tem interesse real na sua vida, que zela pela sua felicidade, que se preocupa quando as coisas não estão dando certo, que sugere caminhos para melhorar, que coloca-se a postos para ouvir suas dúvidas e que dá uma sacudida em você, caso você esteja delirando. "Não seja tão severo consigo mesmo, relaxe um pouco. Vou te trazer um cálice de vinho".
Sentir-se amado é ver que ele lembra de coisas que você contou dois anos atrás, é vê-lo tentar reconciliar você com seu pai, é ver como ele fica triste quando você está triste e como sorri com delicadeza quando diz que você está fazendo uma tempestade em copo d´água. "Lembra que quando eu passei por isso você disse que eu estava dramatizando? Então, chegou sua vez de simplificar as coisas. Vem aqui, tira este sapato."
Sentem-se amados aqueles que perdoam um ao outro e que não transformam a mágoa em munição na hora da discussão. Sente-se amado aquele que se sente aceito, que se sente bem-vindo, que se sente inteiro. Sente-se amado aquele que tem sua solidão respeitada, aquele que sabe que não existe assunto proibido, que tudo pode ser dito e compreendido. Sente-se amado quem se sente seguro para ser exatamente como é, sem inventar um personagem para a relação, pois personagem nenhum se sustenta muito tempo. Sente-se amado quem não ofega, mas suspira; quem não levanta a voz, mas fala; quem não concorda, mas escuta.
Agora sente-se e escute: eu te amo não diz tudo.